segunda-feira, 23 de fevereiro de 2015

Ainda debaixo das sombras de Grey

O que disse Patricia Arquette ontem, na entrega dos Oscars, ecoa com a queixa de outras mulheres que começam a fazer públicas denúncias sobre o tratamento dado pela indústria do cinema à atrizes, produtoras, diretoras e outras profissionais da sétima arte. A lista é longa: Cate Blanchett, Ellen Page, Geena Davis, Zoe Saldanha, Olivia Wilde, Jennifer Garner, Mindy Kaling, Lena Dunham, Eva Mendes, Kerry Washington já declararam que não têm o mesmo tratamento dados a sus companheiros do sexo masculino. O que querem? Igualdade de salários, não ser tratadas como objeto sexual, mais filmes com mulheres protagonistas, o reconhecimento do seu trabalho porque são competentes. Os números evidenciam essas diferenças. Um pequeno resumo: na história dos Oscars, apenas quatro mulheres foram nominadas a melhor diretora e só uma ganhou o prêmio: Kathryn Bigelow, por Guerra ao Terror, em 2008 (um filme de ação, o que é mais incrível ainda). Em Cannes, três mulheres levaram a Palma de Ouro, em duas ocasiões: Jane Campion por O Piano (1993) e Adèle Exarchopoulos junto com Léa Seydoux por Azul é a Cor mais Quente (2013).

Alguém poderia argumentar que há menos mulheres porque elas não se interessam em ser diretoras e produtoras, aceitam papéis que apenas ressaltam sua sexualidade ou não têm as características (atribuídas aos homens) para sobressair numa indústria tão competitiva. Seriam passivas, por exemplo. Será esse o problema ou vamos ao começo de tudo? Quando uma menina diz em casa que quer ser diretora de cinema, provavelmente pode ouvir que isso é coisa de menino e que debe tentar outra profissão porque exige muita firmeza, agressividade e por aí vai (meninas não devem ser agressivas...). Se consegue sobreviver a esse discurso e insiste em cursar a faculdade de cinema, se enfrenta ao mesmo problema: “Diretora não. Melhor deixar essa função pro seus companheiros de classe. É muito pesado para uma garota. Você é bonitinha, pode conseguir algum sucesso como atriz” e blá, blá, blá... Se ainda insistir, pode que apareça outra Jane Campion, outra Kathryn Bigelow, uma Isabel Coixet, uma Icíar Bollaín, Agnès Varda, Sofia Coppola, Chantal Akerman... Não são muitas em quem buscar inspiração. O bom é que elas tão botando a boca no mundo e há esperança de que as diferenças diminuam com as novas gerações de cineastas. No entanto, o caminho a percorrer é longo e a indústria do cinema parece ainda dizer às mulheres: o lugar de vocês continua sendo debaixo das Cinquentas Sombras de Grey.

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